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quarta-feira, 4 de novembro de 2009

LIBERTINAGEM CCXXII


Clariceando (ou Kunderismos)


Por muito tempo fui hipnotizada pela vertigem. A tontura e a embriaguez do precipício, escadas em caracóis intermináveis com fundo de eco. A morte ali em baixo - petit mort, como diria Bazárov*. O coração pulsando forte de vida, embaralhado do descompasso de tirar o tecido do lugar, véu vibrando de loucura e medo, chamado ao chão pela gravidade.

Gravidade que nunca deixa a água derramar. Estou fascinada pela água. Pelo fluxo, pelos círculos de vibração quando atiro a pedra bem perfeita. Pedra sem limo, sem furos.

Porque mexi na água parada fétida do marasmo, inerte, e obriguei-me a pescar botas e pneus lá do fundo. Tudo por culpa da vertigem, com a bênção de Kundera, que leva o mérito por perder-me neste abismo dizendo que a vertigem não é o medo, mas sim, o desejo de cair.

Não quero uma lagoa. Não quero pântano. Tampouco uma bacia dágua como espelho. Quero a frieza da água de primavera que jorra da pedra, onde borboletas e escaravelhos moram e de onde a liberdade dos saíras coloridos se banha, onde o bem-te-vi-te-espia, bebe da mesma água que leva sua sujeira, o pobre.

Corredeira de transparência gelada que não deixa o coração parar, navalha afiada que opera a alma. Onda de prazer que vai, volta, vai, volta, vai, volta, se acalma e volta, sempre volta. Sempre. Sempre se renova, sempre se reinventa. É frágil mas voa até o céu, mora na nuvem.

Tem gente que acha que o fogo tem o arquétipo da intensidade. Eu não.




Piadas internas:


1) Porque saímos da água.


3) Mamãe Oxum, ou Sexy Yemanjá...

4) Água (Oxum) + Capricórnio (terra) = LAMA!



2 comentários:

  1. Estou entrando de intrometido no seu blog, espero que não faça mal.
    Precisava comentar, porque achei o máximo. Uma viagem louca e livre e abstrata e porreta. E eu nem gosto de Clarice, e isso me deixou mais chapado ainda.
    Claro que não entendi as internas (acho que as externas já dão um certo trabalho pra pegar direito), mas que legal.
    Só queria manifestar isso.
    Abraço! (:

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  2. Meu caro "dequeladotuestas", a vertigem sempre me amedrontou e me fez suar frio: como a paixão que nos traga. Me vem o Milan Kundera (na "insustentável leveza do ser") e me fala bem isso: uma comparação perfeita com a entrega. E o precipício das escadas de caracóis. E o Vinícius de Moraes também, amigos falam no filme da atração dele pelo precipício da paixão... mas sabe... To meio cansada dessa paixão que muitas vezes consome, como o fogo.E muitas vezes, não acaba em sexo. E eu tava pensando numa imagem mais parecida com sexo... algo que se renova, algo que se funde, se mistura, se liquefaz numa solução.Aí veio a água... sou apaixonada por água, por travessias, cachoeira, por mar, por banho gelado. O texto surgiu quando me dei conta que a água vem me parecendo bem mais sexy, até mais do que a vertigem por si. E me lembrei de uma vez que numa trilha, segui até chegar numa nascente, láaaa em cima víamos 30 metros de queda dágua. O nascimento da água da pedra é uma coisa muito doida. E essa imagem sempre me faz bem... gosto de ver a água jorrando, como os fluidos do corpo. É disso que somos feitos, não???
    Quanto às piadas internas, não se preocupe. Numa delas, deixei um link... do meu amigo Bazárovitch, que lembra que as francesas chamam o orgasmo de "petite mort". As outras são do pessoal do curso de Ciências Sociais, onde um professor falou que, intelectualmente, somos tão nenéns na escala evolutiva que ainda estamos saindo da água. As outras são por consequência das minhas orixás: são fluidas, se agregam, fazem volume, captam vibrações.

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